Não se trata de um livro “negro” como a capa pode enunciar; não se trata de um livro sobre a morte ou a loucura; trata-se de um livro sobre a vida nas suas múltiplas facetas; sobras as angústias do viver, do sentir, do amar e do morrer.
A proximidade entre o Bem e o Mal; entre o amor e o ódio; a vida vizinha da morte – um caminho apenas. Talvez a cruz de Jerusalém, cidade e nome do livro, metáfora para o hospício Georg Rosemberg, onde Mylia e Ernst viveram, amaram e conceberam Kaas. É Mylia quem diz, citando a Bíblia: “Se eu me esquecer de ti, Jerusalém, que seque a minha mão direita”. E mais adiante: Se eu me esquecer de ti, Georg Rosemberg”, que seque a minha mão direita”.
Numa escrita crua, dura, directa e atraente, Gonçalo M. Taveres percorre a vida de personagens-tipo, que vivem nas margens ténues da loucura normal.e convida-nos para um mergulho profundo na mente humana, no que ela tem de terrível. Boa parte da acção passa-se no hospício George Rosenberg, mas rapidamente concluímos que de um “lado” e do “outro”, nem tudo está bem, nem tudo está mal entre o comportamento daqueles que são considerados loucos e os ditos normais. O autor usa a imagem de uma caixa negra como metáfora desta relação: quem está lá dentro vê o que está dentro e o que está fora; mas, estes últimos, só vêem o que está fora. A acentuar a dicotomia, temos ainda o facto de os personagens que circulam livremente serem capazes de actos de violência e repulsa para com os seus semelhantes ( o pai do médico rejeita o neto adoptivo por causa da deficiência e aconselha o filho a fazer o mesmo para não lhe prejudicara carreira...), enquanto os loucos têm sentimentos e são capazes de sentir amor uns pelos outros ao ponto de criarem vida...
Onde é que está o Bem, onde é que está o Mal? Será que se equilibram e anulam? A morte do assassino de uma criança, em frente à mãe da vítima, que desconhece o facto, é determinada, é um mero acaso, ou é a vitória do Bem sobre o Mal?«Jerusalém» é nome da cidade símbolo da encruzilhada de civilizações e das religiões. Aqui, é o símbolo dos caminhos obscuros que a mente humana pode percorrer.
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