PABLO NERUDA (1904–1973)
Tradução de José Jeronymo Rivera
Sobe a nascer comigo, irmão
E tua mão estende-me da funda
zona de tua dor disseminada.
Não voltarás do fundo dos rochedos.
Não voltarás do tempo subterrâneo.
Não voltará tua voz endurecida.
Não voltarão teus olhos perfurados.
Vem me fitar da profundez da terra,
lavrador, tecedor, pastor calado:
domador de guanacos tutelares:
pedreiro por andaimes desafiado:
aguadeiro de lágrimas andinas:
joalheiro dos dedos machucados:
agricultor tremendo na semente:
oleiro em tua argila derramado:
trazei ao cálix desta nova vida
as vossas velhas dores enterradas.
Mostrai-me vosso sangue e vosso corte,
dizei-me: aqui fui castigado,
porque a jóia não rebrilhou, ou a terra
não entregou a tempo a pedra ou o grão:
assinalai-me a terra em que caístes
e o madeiro em que vos crucificaram,
acendei-me as antigas pederneiras,
as velhas lâmpadas, os látegos gravados
por séculos e séculos nas chagas
e os machados de brilho ensangüentado.
Venho falar por vossa boca morta.
Na vastidão da terra juntai todos
os silenciosos lábios derramados
e do fundo falai-me toda esta longa noite
como se eu estivesse ancorado convosco,
contai-me tudo, cadeia a cadeia,
contai elo por elo, e passo a passo,
afiai os facões que conservastes,
ponde-os em meu peito e em minha mão,
como um rio de raios amarelos,
como um rio de tigres enterrados,
e deixai-me chorar, horas, dias, anos,
idades cegas, séculos estelares.
Dai-me o silêncio, e a água, e a esperança.
Dai-me o combate, dai-me o aço e os vulcões.
Trazei a mim os corpos como ímãs.
Acudi minha boca e minhas veias.
Falai pelo meu verbo e por meu sangue.
Deixai-me chorar, horas, dias, anos, idades cegas, séculos estelares.
Dai-me o silêncio, a água, a esperança, a luz, a paz
Dai-me o combate, dai-me o aço, a força dos vulcões, o fogo e a revolta.
Acudi minha boca e minhas veias.
No, no, no nos moveran
Falai pelo meu verbo e por meu sangue. Nao deixes que me domem.
Nas minhas costas não!
no, no, non nos moveran
sobe a nascer comigo
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