sábado, 12 de março de 2011

1300 - O que nos faz ser como somos...


Foi um momento absolutamente fantástico! reencontrei uma pessoa que já não via há mais de 25 anos e que era dos meus tempos de estudante em Coimbra!

Tivemos uma conversa absolutamente emotiva mas que me soube tão bem... foi como um reencontro de raízes...

A memória atraiçoa-nos quando olhamos sozinhos para trás ao fazer o balanço de perdas e ganhos, pensamos que mudámos muito e que há coisas que fazemos que podem ter razões espúrias. Fugas para a frente, sei lá. Levamos tantos anos a ser "julgados", "avaliados" a ser observados pelos outros que nos convencemos que as suas verdades sobre nós são mesmo verdades. E se fossem, perguntamos nós? e vamos interiorizando que mudámos, que já não somos fiéis ao que éramos, que isto e que isto aquilo...

Foi muito bom este momento arqueológico que nos fez consciencializar que somos o que já éramos e que o nosso percurso de vida é coerente com o que buscávamos

Já escrevi sobre isso e tenho memória duma conversa absolutamente banal que tive com a mãe de uma colega quando tinha os meus 13, 14 anos: "Voa alto! não deixes que a mediocridade seja a tua praia! voa!"

E bati as asas, procurei o belo, o amor, a perfeição e a pureza! em Coimbra ainda a procurava. Já era como sou agora. Bem me parecia mas já não me lembrava!

Tenho passado a vida a procurar esse ideal. Nunca o encontrei e já caí muitas vezes do "cavalo". Desilusões, dúvidas (muitas, muitíssimas)


"Quando um amigo pretende explicar o nosso carácter e destrinçar as nossa intenções, quando reduz todos os nossos actos a princípios, preconceitos, crenças, a uma concepção do mundo que, segundo ele, nos são próprios, ouvimo-lo, pouco à vontade, sem poder negar o que diz, nem aceitá-lo completamente.
Talvez a construção seja verdadeira,mas qual é a verdade? falta o calor íntimo, a vida, o imprevisível que somos sempre para nós próprios e a familiaridade cansada que somos também, e a decisão de nos acomodarmos a nós próprios ou de fugir a nós, e as deliberações perpétuas, e a invenção perpétua do que somos, e o juramento de sermos aquilo e não outra coisa, em suma, a Liberdade"

J.Paul Sartre in Ensaios

E se fosse verdade o que dizem de nós? que já não somos o que pensamos que somos? que é tudo agitação e fuga?

Procurei a verdade, a beleza, ... não a encontrei?
Sim há momentos em que a encontro!

Mas deste encontro com o passado fica uma reconciliação comigo próprio. Eu sempre fui assim! (quer dizer, isto não é argumento para não polir as arestas e melhorar, porra! não vivo sozinho) mas "pode alguém ser quem não é?"
Que bom consciencializar que tenho sido fiel a um ideal! que procurei, que tentei manter-me firme e decidido!

"Podes ter uma luta que é só tua
Ou então ir e vir com as marés
Se perderes a direcção da lua
Olha a sombra que...
tens colada aos pés"

Que bom saber que nunca perdi a sombra que tenho colada aos pés! que bom!
"after changes upon changes we are more or less the same" Com tudo o que bom pode ter esta frase! fidelidade, coerência!

Não!!!! felizmente que nunca poderei fazer minhas as palavras do Álvaro de Campos:

"Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?"

Não, não falhei! tenho sido coerente a um ideal. chega? chega pois! posso olhar-me ao espelho!

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(não consigo escrever mais... se calhar a catarse não está ainda toda feita!)
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- Senhora de preto
diga o que lhe dói
é dor ou saudade
que o peito lhe rói
o que tem, o que foi
o que dói no peito?
- É que o meu homem partiu

Disse-me na praia
frente ao paredão
“tira a tua saia
dá-me a tua mão
o teu corpo, o teu mar
teu andar, teu passo
que vai sobre as ondas, vem”

Pode alguém ser quem não é?
Pode alguém ser quem não é?
Pode alguém ser quem não é?

Seja um bom agoiro
ou seja um mau presságio
sonhei com o choro
de alguém num naufrágio
não tenho confiança
já cansa este esperar
por uma carta em vão

“por cá me governo”
escreveu-me então
“aqui é quase Inverno
aí quase Verão
mês d'Abril, águas mil
no Brasil também tem
noites de S. João e mar”

Pode alguém ser quem não é?

É estranho no ventre
ser de outro lugar
e tão confusamente
ver desmoronar
um a um sonhos sãos
duas mãos
passando da alegria ao desamor

Pode alguém ser livre
se outro alguém não é
a algema dum outro
serve-me no pé
nas duas mãos,
sonhos vãos, pesadelos
diz-me:
Pode alguém ser quem não é?


2 comentários:

  1. Creio que sei do que falas, esta semana graças ao Facebook encontrei 2 amigos do tempo do Liceu, foi um prazer...

    Beijo*

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  2. Que post bonito. Por tanto, por muito...

    Beijo, João.

    ResponderEliminar

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