Decidi ir à praia à tarde.
Chego à Costa de Caparica e ao parque de estacionamento. Vejo muitos carros a sair; fico satisfeito por pensar que irá ser fácil encontrar lugar.
Informam-me que a Via Verde está fora de serviço; apalpo o bolso e vejo que tenho moedas. Entro e estaciono.
As praias estão cheias e está hasteada bandeira amarela.
Chego à segunda praia: há uma enorme escada de madeira, meio instável; decidimos não a usar para chegar à areia. Constato que já não existe a escada de cimento, a meio da praia, que vinha da minha infância. A alternativa seria ir até ao fim do paredão para descer pela rampa dos barcos de pesca artesanal.
Opto por descer por umas pedras; escorrego e caio. Sou prontamente ajudado por um casal que saía da praia. Agradeço e informo que foi só o susto: “Está tudo bem, está tudo bem” — repito, também para mim mesmo.
Arranjo um lugar à beira-mar; aqui ficamos. Está bandeira amarela, a maré está cheia… sinal de que começou a vazar e, como é normal na Costa, a água está a puxar…
O nadador-salvador, atento à praia e aos banhistas, apita para um ou outro virem mais para terra. Parece-me que é obedecido…
O primeiro e o segundo banhos foram reconfortantes! Estava calor, a água a boa temperatura. A praia da Costa estava, como de costume, com ondas; soube-me bem.
Quase que levo com um surfista e dois ou três miúdos que vêm com as ondas…
De regresso à toalha, saco de um livro. Veio uma onda e molhou a minha toalha.
Mudamos de poiso. Aqui também há muita gente. Sento-me na toalha molhada para poder ler. Por algum motivo, não me consigo concentrar na leitura. Percebo que há música perto de nós: no meio de um grupo de adolescentes, um deles traz uma coluna Bluetooth. Anda com a coluna na mão e mal consegue jogar futebol com os amigos tal o desiqulíbrio que a coluna lhe dá.
Penso, mais uma vez, que deveria trazer sempre comigo também uma coluna Bluetooth e pôr o meu Mozart em altos berros — a Sinfonia nº 40, por exemplo, ela que me acompanha em tantas noites de trabalho — ou uma bela ária de ópera, em que as potencialidades da voz feminina são exploradas até ao extremo.
Procuro pôr o som na minha frequência muda e retomar a leitura.
Voam dois chapéus de sol, mas nem dei pelo vento. Fui de novo à água.
Já ao final da tarde, constato que a praia está mais vazia. Aqui e ali joga-se à bola e vejo, ao meu lado, um embrulho de Calipo e um pedaço de película de embrulho de sandes. Olho melhor e encontro mais duas garrafas de água na areia. Reparo que há oito caixotes do lixo atrás de nós e vem-me à cabeça a polémica recente sobre o currículo de cidadania. Lembro-me das aulas de Ciências Sociais que tive em 1976 e de um livro de Dragomir Knapic, que continha imagens de petroleiros a derramar petróleo nos mares e que me deixavam a pensar. Penso em cinquenta anos de educação ambiental e no lixo que estava naquela praia. Muito lixo mesmo.
As pessoas estendem a toalha em cima de lixo, lixo. A praia estava mesmo imunda: uma fralda no paredão…
Penso outra vez nas aulas de cidadania, na reciclagem e na educação ambiental… (E eu que até creio no potencial transformador da escola.)
Três R: Reduzir, Reutilizar, Reciclar… Percebo que já não sei quantos são. Há uns tempos ouvi quatro R: Reduzir, Reutilizar, Reciclar e Recusar. Acho que já há cinco! Deve ser daí que vem esta confusão na praia, penso eu…
Vou a um café e peço uma Coca-Cola Zero, com gelo. Dizem-me que não há gelo. Peço, em alternativa, uma água com gás com sabores.
Perguntam-me que sabor quero. Digo limão. Trazem-me, com enfado, água de sabor a framboesa e outra de um sabor qualquer. Digo que prefiro então a Coca-Cola Zero, sem gelo.
Dizem-me que não há Coca-Cola e perguntam se pode ser uma Pepsi. Respondo que sim…
A menina que me trouxe as águas desinteressa-se de mim, pois lhe dá trabalho andar para lá e para cá. Diz à outra menina: “O que é que ele quer?”
Vem a Pepsi.
Não é Zero! Digo até que pode ser uma cerveja.
A outra menina do balcão traz-me uma Coca-Cola Zero, sem gelo, e eu peço desculpa pelo trabalho. Quem está comigo repreende-me: quem tem de pedir desculpas é uma das meninas…
Abro o meu telemóvel… Uma story mostrava três casamentos e três lutas entre noivos relacionadas com a abertura do bolo de noiva impedindo que todos os presentes vivessem um momento de verdadeira comunhão e partilha da alegria dos noives, partilhando um bolo significativo em comum. Noutro discutia-se um artigo do Expresso que só podia ser lido pelos assinantes ou subscritores do Jornal. Deste modo, discutia-se a partir do destaque sem conhecer o texto... Noutro ainda discutia-se acaloradamente qualquer coisa de que já nem me lembro — a espuma dos dias. Desligo o telemóvel. Olho ao lado e duas pessoas filmam comida e pergunto-me: para quê?
Vou para o carro e ainda está gente na praia. Está já lusco-fusco. A maré estava mesmo a descer e ainda se tomava banho. Ondas mais baixas e os inevitáveis telemóveis a filmar sei lá o quê, pois o pôr-do-sol já tinha sido.
Chego ao carro e há fila para pagar na máquina. Aguardo respeitosamente… 1,20 euros. Pago.
A água nem estava má.